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Mostrando postagens de fevereiro, 2011

História de um suspiro

Fui inspirado hoje. Lentamente passei por um belo e jovem nariz, desci por dutos aquecidos, ocupei dois grandes pulmões de alvéolos macios. Depois saí por onde tinha vindo, porém eu já não era mais o mesmo. Trazia em mim algo daquele corpo, na mesma medida do que de mim lá dentro teria ficado, ou talvez fosse eu mesmo, mudado. Expirado.

Pessoas de Vidro

Há pessoas de vidro perfeitamente esmaltadas e cheias de conteúdos coloridos como as garrafinhas de areia, porém lisas, frias e frágeis, a ponto de poderem se quebrar a qualquer movimento em falso, porém pesadas e robustas a ponto de pesarem como pequenos fardos. Elas parecem de plástico, ou mesmo de borracha, mas a impressão é falsa. Basta tocar.

estações erradas

Passados sete anos, seus sete anos de expiação, o destino voltava a ser-lhe favorável. Abaixando-se, pegou a nota de 20 e sorriu. Hoje não precisaria voltar à pé pela escuridão, nem comer os restos do restaurante da pensão. Viajaria de ônibus e compraria seu próprio jantar, depois seria uma latinha de cerveja e um café. Há sete anos não sentia tamanha esperança. Era hora de procurar um emprego, de dormir sobre lençóis limpos e colchões sem insetos, de repor os dentes que faltavam, de usar roupas do tamanho certo. Há sete anos quebrara tantos espelhos que sua vida regredira à idade média. No pior de seus dias fáceis não teria sido capaz de conceber a existência de tanta gente rudimentar como as pessoas ao redor. Tivera família, uma loja, funcionários, casa, carro, dinheiro no banco. Então os espelhos apareceram por toda parte, vindos sabe lá de onde, e começaram a cair sobre sua cabeça, cortando, separando, roubando, destruindo, até que se percebera miserável. Agora ia jantar e depois d

Coisa que acontecem quando não tem ninguém olhando - XV

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Azulejos brancos, chão úmido, luz fria e insuficiente, zumbido dos refrigeradores. Atrás do balcão, uma pessoa repugnante veste roupas brancas completamente encardidas e meladas de sujeiras impensáveis. Peixes fedem em bandejas de plástico em meio a escamas e gelo, criando uma atmosfera de horror na peixaria sombria. O Sr. Alberto pediu que embrulhassem uma sereia não muito fresca, que soubesse cantar. Planejava levá-la em uma viagem a Gdansk, para inspecionar submarinos poloneses, mas a tal sereia revelou-se tão abusada desde o princípio que da banheira não saía para lugar algum. Era verão e já na segunda semana o cheiro de maresia, que era quase palpável no pequeno apartamento, não era percebido pelo proprietário. Aos cheiros se acostuma, mas cheirava mal o Alberto, que há dez dias não tomava banho. Viveram aquele estranho romance até que aconteceu o inevitável: pelicanos invadiram o banheiro e a despedaçaram. Dela comeram quase tudo, sobraram só algumas postas dilaceradas que render