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Mostrando postagens de março, 2013

o numero da vovó

Havia um caixão pesado e um coveiro apenas, que não conseguia levantá-lo porque era pesado demais para ele. Havia um grupo de pessoas tristes e pouco espaço, pouco adiantavam os braços. Havia um túmulo sujo, descuidado, anônimo, à espera do caixão, que fora impedido de entrar no túmulo correto por uma das irmãs más do castelo, que reservara o buraco para os seus. Havia um corpo inchado, sofrido, triste e desfigurado no caixão, alheio a tudo isso. Havia o sol, escaldante sol, e aos poucos os braços conseguiram passar por baixo, o peso levantar, e o coveiro à cova baixou o corpo da melhor pessoa que no mundo havia. Lacradas as bordas de cimento cinzento, colamos com superbonder um caco (recolhido de outra tumba) sobre um papelzinho numerado para nunca esquecermos onde vovó estava guardada. 54330.

A Caminho da Uruguaiana

Era uma rua normal do centro da cidade, dessas mal cheirosas e gordurosas, e caminhava entre a multidão apressada sentindo meus pés ora respingarem águas sujas, ora escorregarem na sujeira. Sentada numa cadeira bem na esquina, uma mulher loira fazia as unhas do pé. Não pude deixar de reparar no seu dedinho, que era na verdade apenas meio dedinho e terminava num toco esbranquiçado de osso com um tanto de revestimento esponjoso de carne. Não havia sangue, parecia tudo um tanto ressecado, como uma esponja velha, e a mulher fazia as demais unhas sem pensar nele. Tomei o metrô, mas o toco de dedo não me saía da cabeça. Fiz algum comentário a respeito com uma senhora que dividia o banco comigo e ela arregalou os olhos assustada, sussurrando algo que não pude compreender. Desembarcou às pressas, olhando ao redor. No dia seguinte, lá estavam as mesmas ruas, e na mesma esquina a mulher do dedo misterioso. Dessa vez, tocava acordeon e remexia um chapéu de moedas c