A Caminho da Uruguaiana
Era uma rua normal do centro da cidade, dessas mal cheirosas
e gordurosas, e caminhava entre a multidão apressada sentindo meus pés ora
respingarem águas sujas, ora escorregarem na sujeira.
Sentada numa cadeira bem na esquina, uma mulher loira fazia
as unhas do pé. Não pude deixar de reparar no seu dedinho, que era na verdade
apenas meio dedinho e terminava num toco esbranquiçado de osso com um tanto de
revestimento esponjoso de carne. Não havia sangue, parecia tudo um tanto
ressecado, como uma esponja velha, e a mulher fazia as demais unhas sem pensar
nele.
Tomei o metrô, mas o toco de dedo não me saía da cabeça. Fiz
algum comentário a respeito com uma senhora que dividia o banco comigo e ela
arregalou os olhos assustada, sussurrando algo que não pude compreender.
Desembarcou às pressas, olhando ao redor.
No dia seguinte, lá estavam as mesmas ruas, e na mesma
esquina a mulher do dedo misterioso. Dessa vez, tocava acordeon e remexia um
chapéu de moedas com o pé mutilado.
Desisti de descobrir algo sobre ela, acendi um cigarro e fui
para o metrô. Afinal, moro no Rio de Janeiro. Na esquina seguinte já tinha uma
velha espetando agulhas na bochecha.
Comentários