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Mostrando postagens de fevereiro, 2008

Triglicerídeos, para onde vocês vão?

Sinto o poder dos triglicerídeos, que comandam insanidades variadas em meu sangue e permitem que as pernas dancem assim mesmo depois de décadas congeladas. A uma taxa de 450 nem sei do que sou capaz, andando por aí como uma caldeira à moda antiga. Mas cuido bem deles, sempre que consigo ofereço-lhes uma feijoada ou salames gordurosos e sensacionais. Imagino o que poderia acontecer se fosse obrigado a perdê-los, e como nas perdas de amor já sinto o coração apertado e deficiente. Ficaria mau, egoísta, fraco, magro, nervoso, doente. Ou não saberia mais pensar, viraria destro, manco, torceria por outro time, gostaria de uísque, de caldo verde e brócolis, ficaria careca, impotente, mudo, cego, talvez. E se meu sangue for substituído, transformado, circular no sentido inverso, aflorar, esguichar e se esvair, e eu ali ficar, lívido, amarelado e frio caído sobre um leito de folhas? Melhor seria jamais ter provado tais venenos que sabê-los seus por toda uma vida e agora ser obrigado a deixá-los

Histórias Encaixadas - Parte 2: Favela

Era tarde da noite. Cleonice amassava algumas ervas, misturava alguns pós. Velas acesas por toda parte, cheiro de fuligem, um aspecto bastante sinistro no barraco de madeira. Revirava os olhos, como que em transe, e balbuciava sons incompreensíveis. Assustados, todos ao redor tinham muito respeito por seus poderes. Estavam ali presentes os chefões do tráfico e os policiais do posto de vigilância. Deviam mesmo a ela e seus feitiços a conquista de algumas bocas à facção rival, sem nenhuma baixa entre os aliados. Os rivais, porém, ou foram cortados à bala ou queimados na “churrasqueira”, que era uma área de execução no alto do morro. Colocavam o bandido preso em uma pilha de pneus e ateavam fogo. Dona Cleo, como era chamada, deu um grito terrível e entregou a um dos PMs presente uma fita métrica: a esposa estava grávida e passava mal, corria o risco de perder a criança, o soldado buscava ajuda. - Pega essa fita, mede a perna dela e vê quanto pesa. Se der mais de dez quilos ela está com fe

Histórias Encaixadas - Parte1: Natal

Em pé, praticamente em todas as esquinas, nas lojas e mercados, Papais Noéis variados: altos, baixos, anões, magros, gordos. Roupas novas, gastas, vermelhas em diversas tonalidades, barbas volumosas, ralas, compridas, aparadas, imperiais ou modernas, gorros curtos ou compridos. Nenhum, porém, igual ao que circulava nos meus sonhos. Eu vinha sonhando com um mesmo Papai Noel há várias noites, um sonho repetitivo e obssessivo com o mesmo sujeito, nas mais estranhas situações ele sempre acabava aparecendo. Aquele era perfeito, como os desenhados por Norman Rockwell, padrão Coca-cola, e me perseguia pelo cenário que fosse. Isso era o que havia de estranho e assustador. O Papai Noel dos sonhos é aquele que mora na Lapônia, mas não hesitava em aparecer no banco do carona, num jogo de sinuca ou numa piscina imaginária. Pode parecer estranho, mas fiquei com medo dos velhinhos de vermelho, e sair de casa nesta época do ano tornou-se algo bastante aflitivo. Não pude evitar completamente as lojas,