Melancólica

- E então, você está feliz hoje?

Conseguiu um pouco de cada coisa, foi aos lugares todos, viu as cenas imperdíveis, encontrou as pessoas certas e no final ainda tomou uma cerveja.

Isso tudo naquela parte da janela de personalidade que é acessível a qualquer um, e também de certo modo na parte restrita, mas como saber o que acontece no seu outro hemisfério? A parte privada queria mesmo aquele cara ou ele era só um desses acasos da noite?

Tudo isso Mariana pensava em frente ao espelho, a cara borrada e já desfeita, quase amanhecida, melancólica.
Melan-cólica pensava agora na palavra, soava tão desproporcional ao que uma pessoa deveria ser capaz de sentir, soava como uma cólica potencializada.
Melan-cólica. Por que algumas palavras conseguem ser tão cruéis?

Pensava naquela música do Cartola, onde as rosas exalavam o perfume dela, e um cara em algum lugar devia estar sentindo aquilo com olhos tristes, mas ela não conseguia sonhar os sonhos de ninguém.
Uma espécie de autopunição, condenava a felicidade do dia que ia terminando diante da impossibilidade de continuar com o tal menino ocasional, a busca por alguém e por si mesma nunca terminaria.

No espelho podia ver umas primeiras ruguinhas ao redor dos olhos, olheiras, um tom de pele meio desbotado, o fio de cabelo branco na sobrancelha, um desânimo de não saber o que realmente queria da vida.

Melancolia.

Limpou os olhos com o demaquilante, limpou a base e o que havia por cima, blush, sombra. Tirou o vestido curto e o sutiã com enchimentos.
Olhou para o reflexo novamente, com algum desgosto. Tirou a lente azul e por último a peruca moderninha e foi dormir menino mais uma vez.

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