Olhos Azuis

A menina fechou a porta do banheiro sem fazer barulho. Delicadamente, estendeu sobre a bancada um lenço branco bordadinho. Abriu um pequeno estojo de porcelana, colocou um pouco de água morna e arrumou bem no centro do lenço.
Levou as mãos ao rosto em meio a um sorriso e experimentou algumas caretas divertidas. Segurou o olho esquerdo, com um gesto suave porém decidido, introduziu o indicador na lateral, perto do nariz, e com um barulhinho úmido – ploc – arrancou o olho.
Colocou o globo no estojo, esfregou um pouco para limpar, o olho bom viu a água tingir-se de um rosa claro, como o do seu vestido, o olho de vidro olhava para ela lá do fundo.
O espelho refletia o rosto adolescente, de pele lisa e sedosa, cabelos curtos tingidos de azul, longos cílios e o vazio onde se encaixava o olho.
Era um buraco escuro, lá dentro escondiam-se o cérebro e todas as conexões que faziam a menina funcionar.
Larissa passou o dedinho bem de leve ao redor do buraco, arrepio, era sensível como a sola dos pés, uma sensibilidade aflitiva. Deslizou o indicador lá para dentro, nunca antes tivera essa coragem.
Sentia a ponta da unha explorando o lado de dentro da cabeça, tocava em partes macias, partes úmidas, partes retesadas, sentia-se invertida, sentia-se por dentro e por fora, conectada. Explorou-se um pouco, inundada de sensações.
Então viu novamente seu reflexo, e viu o que fazia, surpreendida, como se estivesse nua em público. Aflita e culpada, retirou os dedos, introduziu um chumaço de algodão no buraco e recolocou o olho.
Reflexo..escorria uma gotinha de sangue, como uma lágrima, que a menina lambeu com a pontinha da língua.

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