Tarde-Mart

O mercado estava excessivamente lotado, tanta gente e carrinhos que o trânsito entre as prateleiras fazia com que as compras demorassem uma eternidade.

José Francisco sentia frio no setor de congelados, estava bloqueado entre quatro clientes e dois freezers horizontais, daqueles bem compridos onde ficam as caixas de nuggets. Precisava ainda chegar aos hambúrgueres, na outra ponta.

Uma promoção anunciada pelos sistema de som fez com que todas as pessoas se deslocassem para o setor de farináceos, como uma onda, e de repente tudo ao redor ficou deserto e ainda mais frio.
Os carrinhos, abandonados cheios, eram apenas um obstáculo a mais e José ia deslocando um por um para passar, o corredor ficando cada vez mais comprido. Estava exausto.

Enquanto escolhia entre a caixa com 4 unidades de 120g, mais suculentos, ou a de 12 unidades de 50g, viu de relance uma sombra despencando do alto. Mal teve tempo de dar um passo para o lado e um pombo se esborrachou ali mesmo onde ele estivera.
O corpinho cinza tinha caído da estrutura do telhado (morava ali?), certamente já morto (de fome? do coração?). Caiu de cabeça, silenciosamente, produziu apenas um fino esguicho de sangue no impacto, uma mancha que parecia gerada por aerosol.

E José fora o escolhido para ver aquilo, por alguma razão incompreensível. Era o único no setor e o pombo fora destinado a ele, por pouco não caíra sobre sua careca. Algum presságio? Qual a chance de um pombo cair sobre você num mercado lotado que de repente ficou vazio?

Precisava agir com rapidez, antes que todos voltassem. Pegou um saco plástico e com ele recolheu a ave do chão. Deu um nó e enfiou num carrinho lotado que estava por ali, escondeu sob uma pilha de bandejas de carne.

Depois foi para o checkout, escolheu uma fila menor, apenas duas pessoas na frente. Meia hora depois, passou suas compras pela esteira, ensacou, pagou. Então cruzou o corredor e saiu da loja.

Nesse mesmo instante começou uma terrível gritaria no extremo oposto, onde ficavam os primeiros caixas, e uma correria similar à anterior, desta vez para fora da loja.

Enquanto guardava as sacolas no porta-malas, José viu a ambulância chegar, e os carros de polícia, e pessoas fugindo em pânico. Ouviu fragmentos de boatos divertidos gritados:
Uma bomba! Uma caveira na bolsa! Um bando de ratos! A carne estava viva! Uma unha no meio das uvas! Saiu sangue da Coca!

Sua tarde pelo menos terminou com alguma diversão!

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